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Estima-se que existam na Terra entre 10 milh�es e 15 milh�es de esp�cies eucari�ticas, como plantas, animais, fungos e outros organismos cujas c�lulas t�m um n�cleo que abriga seu DNA cromoss�mico. Mas apenas 14% deles (2,3 milh�es) s�o conhecidos e menos de 0,1% (15 mil) tiveram seu DNA sequenciado completamente.

O conhecimento dessa pequena fra��o da biodiversidade terrestre resultou em enormes avan�os na agricultura, medicina e ind�strias baseadas em biotecnologia, al�m de melhorias nas estrat�gias para conserva��o de esp�cies amea�adas de extin��o, avaliam pesquisadores da �rea.

A fim de preencher a enorme lacuna no conhecimento e explorar o potencial cient�fico, econ�mico, social e ambiental da biodiversidade eucari�tica terrestre, um cons�rcio internacional pretende sequenciar, catalogar e caracterizar o genoma de todas as esp�cies eucari�ticas da Terra ao longo de 10 anos.

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Os objetivos e os desafios da iniciativa, denominada Projeto BioGenoma da Terra (EBP, na sigla em ingl�s), foram descritos em um artigo publicado nesta segunda-feira (23/04) na revista�Proceedings of the National Academy of Sciences�(PNAS), da Academia Norte-Americana de Ci�ncias.

O projeto ter� participa��o da FAPESP no �mbito dos programas de Pesquisas em Caracteriza��o, Conserva��o, Restaura��o e Uso Sustent�vel da Biodiversidade (BIOTA) e de Pesquisa em�eScience e Data Science.

�A participa��o da FAPESP no Projeto BioGenoma da Terra abre para pesquisadores no Estado de S�o Paulo a possibilidade de participarem em um dos projetos de pesquisa mais ousados da atualidade. Al�m disso, sendo o Brasil um dos pa�ses mais biodiversos, os objetivos podem contribuir de forma muito destacada para o pa�s�, disse Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor cient�fico da FAPESP.

O projeto � considerado um dos mais ambiciosos da hist�ria da biologia e, na avalia��o de seus coordenadores, s� ser� poss�vel realiz�-lo agora em raz�o dos avan�os na tecnologia de sequenciamento gen�mico, computa��o de alto desempenho, armazenamento de dados e bioinform�tica e da queda de custo do sequenciamento de genoma. E, al�m disso, da valoriza��o dos biobancos � locais que armazenam a biodiversidade de forma catalogada, como museus, herb�rios e centros de cole��o de culturas.

Com o custo atual de US$ 1 mil para sequenciar o genoma de um vertebrado de tamanho m�dio caindo, ser� poss�vel sequenciar, ao custo aproximado de US$ 4,7 bilh�es, o genoma de todo o 1,5 milh�o de esp�cies conhecidas de eucariotos. E tamb�m de entre 10 e 15 milh�es de esp�cies desconhecidas � a maioria deles organismos unicelulares, insetos e pequenos animais nos oceanos �, estimam os coordenadores do projeto.

O custo, que inclui gastos com instrumentos de sequenciamento, coletas de amostras, armazenamento, an�lise, visualiza��o e dissemina��o de dados e gerenciamento de projetos, � compar�vel ao investido no Projeto Genoma Humano, iniciado em 1990 e conclu�do em 2003, que custou US$ 4,8 bilh�es.

Os investimentos no Projeto Genoma Humano tiveram enormes impactos n�o apenas na medicina humana, mas tamb�m na medicina veterin�ria, bioci�ncia agr�cola, biotecnologia, ci�ncia ambiental, energia renov�vel, ci�ncia forense e na biotecnologia industrial. Um relat�rio de 2013 do Battelle Memorial Institute estimou o benef�cio financeiro do projeto para a economia dos Estados Unidos em cerca de US$ 1 trilh�o.

Ap�s a conclus�o do Projeto Genoma Humano, muitos organismos de import�ncia biom�dica, agr�cola e industrial tiveram seus genomas sequenciados. E, em 2015, um grupo de pesquisadores das universidades da Calif�rnia em Davis e de Illinois e do Instituto Smithsonian, nos Estados Unidos, organizou uma reuni�o com representantes de universidades, institui��es de pesquisa e ag�ncias de fomento de diferentes pa�ses � que deu origem ao Projeto BioGenoma da Terra � em que decidiram que um projeto ainda mais ambicioso era necess�rio: sequenciar o DNA de toda a vida complexa na Terra.

O professor de evolu��o e ecologia na Universidade da Calif�rnia em Davis e presidente do grupo de trabalho que originou o projeto, Harris Lewin, estima que os impactos econ�micos do projeto BioGenoma da Terra poder�o ser semelhantes ou at� mesmo superar os do Projeto Genoma Humano. Com a diferen�a de que ser�o distribu�dos globalmente e, principalmente, para pa�ses em desenvolvimento, como o Brasil, que det�m grande parte da biodiversidade mundial, ponderou.

�O Projeto BioGenoma da Terra lan�ar� as bases cient�ficas para uma nova bioeconomia que tem o potencial de trazer solu��es inovadoras para problemas de sa�de, ambientais, econ�micos e sociais para pessoas em todo o mundo, especialmente em pa�ses subdesenvolvidos que possuem ativos de biodiversidade significativos�, disse Lewin em comunicado � imprensa.

Em agosto de 2017, com o objetivo de envolver a comunidade cient�fica brasileira no projeto, a FAPESP e a Academia Brasileira de Ci�ncias (ABC) organizaram o�Workshop Biodiversity and Biobank. Realizado no audit�rio da FAPESP, o evento contou com a presen�a de Lewin e de pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos.

Participaram do workshop curadores de diversas cole��es biol�gicas brasileiras, que se reuniram com representantes do EBP e da Global Genome Biodiversity Network para discutir necessidades e entraves para a participa��o brasileira nessas iniciativas.

Potenciais impactos

Na avalia��o dos coordenadores do EBP, os resultados do sequenciamento do genoma de todas as esp�cies eucari�ticas existentes na Terra possibilitar�o o desenvolvimento de melhores ferramentas de conserva��o de esp�cies e ecossistemas amea�ados � particularmente aqueles afetados pelas mudan�as clim�ticas � e de preserva��o e melhoria de servi�os ecossist�micos.

O �ndice Planeta Vivo � que mede as tend�ncias da diversidade biol�gica da Terra � indica que entre 1970 e 2017 ocorreu um decl�nio de 58% das popula��es de vertebrados do planeta, e a Uni�o Internacional para Conserva��o da Natureza (IUCN) estima que entre 23 mil e 80 mil esp�cies pesquisadas hoje est�o se aproximando da extin��o.

Estima-se que at� 50% das esp�cies podem se extinguir at� 2050, principalmente devido ao uso intensivo de recursos naturais, destacam os autores do artigo.

�O Projeto BioGenoma da Terra nos dar� uma vis�o sobre a hist�ria e a diversidade da vida e nos ajudar� a entender melhor como conserv�-la�, disse Gene Robinson, diretor do Instituto de Biologia Gen�mica da Universidade de Illinois e copresidente do grupo de trabalho que deu origem ao projeto.

O grupo de trabalho tamb�m avalia que o projeto ser� essencial para o desenvolvimento de novos medicamentos para doen�as infecciosas e heredit�rias, bem como para a cria��o de novos combust�veis biol�gicos sint�ticos e fontes de alimentos para a popula��o humana, que deve atingir 9,6 bilh�es de pessoas at� 2050.

�Estamos no meio do sexto grande evento de extin��o da vida em nosso planeta, que n�o s� amea�a as esp�cies selvagens, mas tamb�m representa um perigo para a oferta global de alimentos�, ressaltam os autores do artigo na�PNAS.

A fim de atingir os objetivos de sequenciar o genoma da biodiversidade eucari�tica da Terra e disponibilizar as informa��es em um reposit�rio digital aberto, o projeto est� estabelecendo uma s�rie de parcerias com grupos de cientistas que trabalham com diferentes grupos de organismos. Entre eles, o�Global Genome Biodiversity Network, o�Vertebrate Genomes Project, o�Plant Genome Projects�e o 5000 Insect Genomes Project.

Alguns dos principais desafios do projeto ser�o coordenar essas iniciativas de sequenciamento gen�mico em andamento, desenvolver uma estrat�gia global para coleta e preserva��o adequada de exemplares para permitir a produ��o de conjuntos de genomas de alta qualidade e criar ferramentas de computa��o que possibilitem interpretar as sequ�ncias gen�micas armazenadas. E, sobretudo, disponibiliz�-las de modo organizado para a comunidade cient�fica e para a sociedade.

�O sequenciamento do genoma dos organismos talvez represente a etapa mais f�cil do projeto. Os maiores desafios ser�o ter amostras de material com a qualidade necess�ria e ferramentas que possibilitem interpretar a enorme quantidade de dados que ser�o gerados�, disse Marie-Anne Van Sluys, professora do Instituto de Bioci�ncias da Universidade de S�o Paulo (IB-USP), que integra o grupo de trabalho que coordena do projeto.

Os pesquisadores estimam que o sequenciamento do genoma dos organismos dever� exigir cerca de 1 exabyte (1 bilh�o de gigabytes) de capacidade de armazenamento digital e gerar� desafios e oportunidades para o desenvolvimento de algoritmos computacionais que possibilitem visualizar, comparar e entender a conex�o das sequ�ncias do genoma com a evolu��o dos organismos e com os ecossistemas. Al�m disso, poder� dar origem a novas tecnologias para coleta de amostras utilizando drones e ve�culos terrestres e aqu�ticos aut�nomos equipados com c�meras de alta resolu��o.

�O projeto representa uma oportunidade para n�s, pesquisadores no Brasil, de criar e inovar n�o s� em sequenciamento de genoma, mas tamb�m em an�lise e visualiza��o de dados, coleta, preserva��o de amostras e diversos outros fatores�, avaliou Sluys.