MULHERES DO TERCEIRO SEXO
As mulheres
estrangeiras são consideradas como “terceiro sexo” e têm permissão para entrar
em lugares que uma iemenita não ousaria pisar, como por exemplo, numa casa de
chá, ou restaurantes de aldeia, ambientes estritamente freqüentados por pessoas
do sexo masculino. Não é obrigatória, para uma estrangeira, a conservadora vestimenta
negra iemenita de tradição shiita, que deixa, à mostra, apenas os olhos.
Entretanto, são indispensáveis, um xale sobre a cabeça e uma indumentária discreta. Percebi isso quando fui alvo de crítica das
mulheres e de repreensão dos homens ao sair do Hotel com os cabelos de
fora. As mulheres, no Iêmen, têm direito ao voto, mas três entre
quatro são analfabetas. Os partidos são representados por símbolos para
possibilitar a identificação na hora de votar .
MULHERES SEM SEXO
Sob o manto de fragilidade imposto pela religião islâmica, as iemenitas demonstram uma força incontestável. Aprendem
desde cedo que têm mais obrigações do que direitos e mais trabalho do que laser.
em algumas regiões como Tihama, ainda enfrentam o fantasma da circuncisão,
procedimento para a retirada do clitóris, a fim de inibir o desejo sexual,
prática fortemente arraigada na cultura, mas combatida na região urbana por
grupos de mulheres mais letradas. A maior parte das circuncisões, é feita durante o primeiro mês
de vida, geralmente, pelas avós, as quais removem o clitóris da menina
utilizando objetos caseiros como lâminas ou tesouras.
O PRESENTE NO PASSADO
Na região
rural, vivem muito próximo de como viviam os seus antepassados. Ainda hoje, muitas vilas beneficiam-se de cisternas,
sistema utilizado para a captação das águas de chuva e usam lenha para cozinhar.
O trabalho é dividido, indistintamente, entre todos os
membros da família. As crianças também colaboram nas duras tarefas cotidianas,
cumulando, muitas vezes, até duas funções, a exemplo de um menino de
aproximadamente 10 anos que além de pastorar, sozinho, o rebanho de cabras,
ainda carregava sobre a cabeça um feixe de lenha, que parecia ter mais da metade
de seu peso corporal.
“QAT” A ÚNICA DIVERSÃO DA POPULAÇÃO
A
principal diversão para a maioria da população é mascar folhas de “qat”, planta ansiolítica, (tranqüilizante), que abranda a fome e
aplaca o cansaço. Os homens reúnem-se pela manhã e após as
refeições, nos mosques ou nos “suqs” onde conversam sobre diversos assuntos
enquanto mascam a folha. As mulheres também podem desfrutar deste
“prazer”social, mas confinadas em seus exclusivos encontros chamados “tafrita”,
onde retiram o véu num clima de relaxamento.
Curiosos e amigáveis homens e crianças aproximam-se, muitas
vezes, só para atrair a atenção do estrangeiro. Nenhum deles sabe dizer
onde fica o Brasil, mas todos são capazes de enumerar, um por um, os astros da
seleção brasileira, que viraram verdadeiros heróis da população iemenita.
Durante vinte dias convivi com uma cultura exótica de costumes
intrinsecamente ligados a um passado distante que me fizeram repensar nos
valores atribuídos pela sociedade ocidental. Conheci crianças que nunca conheceram a infância, jovens que não
sabem o que esperar do futuro e adultos que não querem que o futuro venha a
mudar. Pude ler nos expressivos olhos daquelas mulheres o que elas jamais
ousariam revelar.
Perante os olhos críticos do Ocidente, a reação daquele jovem iemenita que me
ameaçara com um machado, representou uma demonstração de posse, insinuando o fato de que a esposa é tão propriedade quanto seu rebanho
de cabras.Entretanto, durante as minhas investidas fotográficas por quase todo
país, constatei que as mulheres adultas, mesmo desacompanhadas, costumam
esquivar-se da câmera, e baseada em informações contraditórias, não cheguei à
conclusão se aquele homem estaria defendendo a opção da mulher, ou seu domínio
sobre ela.
No avião, ao retirar da cabeça, o xale que me protegera por
longos dias da censura imposta sob a égide da religião, foi difícil
acreditar que eu quase não me sentia à vontade com os cabelos à mostra.
Márcia Pavarini
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