24/01/2019 ( Caderno:
Seção Saúde )
Sistema
de reconhecimento de expressões faciais desenvolvido
pela Hoobox com apoio do
programa PIPE da FAPESP
pode servir para avaliar o estado de pacientes
em
leitos de UTI, de bebês em berços e de
passageiros em carros autônomos
Na edição de 2019 da maior feira de tecnologia de consumo do mundo – a
Consumer Eletronics Show (CES), no início de janeiro em Las Vegas, nos Estados
Unidos –, um dos destaques do estande da Intel foi um sistema de reconhecimento
facial que traduz expressões em comandos para o movimento de cadeiras de
rodas.
O sistema foi desenvolvido pela Hoobox Robotics com apoio do
Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da
FAPESP.
A startup paulista foi selecionada, em 2018, para integrar um programa de
aceleração da Intel, o AI for Social Good, que promove o
desenvolvimento de soluções de impacto social baseadas em inteligência
artificial, utilizando tecnologias de software e hardware da empresa
americana.
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A iniciativa da Intel permite aos participantes ter acesso a recursos de
capacitação técnica e de marketing compartilhado e a oportunidade de participar
nas rodadas do fundo de investimento da Intel – o Intel Capital – para acelerar
o desenvolvimento de suas soluções tecnológicas.
Por meio do programa, os engenheiros e desenvolvedores da Hoobox têm
trabalhado com a equipe técnica da Intel para otimizar o desempenho dos
algoritmos do sistema de detecção e interpretação de expressões faciais
utilizando hardwares e softwares da empresa.
“O acordo não é de exclusividade. Entendemos que os ganhos em uma parceria
com uma empresa desse porte permitirá transformar o sistema de reconhecimento
facial em soluções já otimizadas que possam ser produzidas em grande escala”,
disse Paulo Gurgel Pinheiro, CEO da Hoobox, à Agência
FAPESP.
O sistema desenvolvido pela empresa traduz expressões faciais em comandos
para controlar uma cadeira de rodas, sem exigir sensores corporais. Hoje, a
tecnologia permite reconhecer mais de 10 expressões, como o arquear das
sobrancelhas ou piscar dos olhos. Também é capaz de prever quando o usuário vai
tossir, espirrar ou bocejar, ou quando está conversando com alguém. Nessas
situações, o reconhecimento das expressões é desabilitado para impedir um
movimento não desejado da cadeira e evitar acidentes.
As expressões faciais dos usuários são capturadas por uma câmera e
interpretadas por algoritmos executados em um minúsculo computador de bordo,
acoplado na cadeira. Os algoritmos transformam as expressões em comandos de
controle, como ir para frente ou para trás e girar para a esquerda ou para a
direita.
Disponível em um kit, batizado de Wheelie 7, a solução leva apenas sete
minutos para ser instalada em qualquer cadeira de rodas motorizada disponível no
mercado, promete a empresa.
“O sistema é capaz de capturar informações de quase 100 pontos do rosto de
uma pessoa, como o formato da boca, do nariz, dos lábios e a cavidade dos olhos,
com alta precisão”, afirmou Pinheiro.
O Wheelie 7 é comercializado exclusivamente no mercado norte-americano,
utilizando o modelo de assinatura. “Não cobramos o kit; o cliente paga US$ 300
por mês”, explica Pinheiro.
Atualmente, 60 pessoas nos Estados Unidos estão usando um protótipo do
sistema. Entre esses primeiros usuários estão pessoas que sofreram traumas na
coluna vertebral e ficaram tetraplégicas, pacientes com doenças
neurodegenerativas, como a esclerose lateral amiotrófica (ELA), ou que sofreram
acidente vascular cerebral (AVC), além de veteranos de guerra.
Há mais 300 em uma lista de espera que deverão receber o kit em abril e
outras 500 que receberão o sistema em dezembro. Para utilizá-lo elas pagaram uma
mensalidade adiantada de US$ 300.
“Essa foi uma forma que encontramos para subsidiar o custo do kit e, ao mesmo
tempo, avaliar como é o uso dele no dia a dia dos usuários para melhorá-lo”,
disse Pinheiro.
A empresa faz planos de trazer o produto para o Brasil, mas acredita que será
necessário conceber outro modelo de comercialização, já que o de assinatura
“parece não funcionar bem no país”.
Novas aplicações
A Hoobox iniciou, agora, uma segunda rodada de captação de investimentos, com
a meta de arrecadar US$ 2,5 milhões até o final deste ano. Os recursos, segundo
Pinheiro, permitirão finalizar o desenvolvimento, o design e testar novas
oportunidades de aplicação para a tecnologia.
“Estamos conversando com alguns fundos de venture capital nos
Estados Unidos, na China e no Brasil. Esperamos avançar nas negociações para
obter novos investimentos e conseguir escalar a produção do sistema para 3 mil
unidades até 2020”, afirmou Pinheiro.
Na primeira rodada de captação de recursos, iniciada em 2017, logo após
encerrar a fase 1 do Programa PIPE da FAPESP – de teste de conceito da
tecnologia –, a empresa foi incubada e recebeu investimentos da Sociedade
Beneficente Israelita Albert Einstein.
A parceria com o Einstein possibilitou testar novas aplicações da tecnologia
de reconhecimento de expressões faciais, como para a detecção de comportamentos
humanos, como cansaço e sonolência, e até 10 níveis de dor, além de agitação,
sedação e espasmos de pacientes em um ambiente hospitalar. A tecnologia será
validada em monitoramento de pacientes em leitos de UTI no Hospital Albert
Einstein.
“Por meio de uma câmera acoplada a um leito de UTI, nosso sistema é capaz de
monitorar ininterruptamente até seis pacientes ao mesmo tempo e determinar o
nível de dor deles, em uma escala de 1 a 10”, explicou Pinheiro.
“Queremos usar a tecnologia não só para detectar comportamentos, mas também
para prevê-los, de forma a garantir o bem-estar dos pacientes e fornecer
informações mais detalhadas sobre o seu quadro para a equipe médica”, disse.
O projeto está sendo desenvolvido pela empresa também em parceria com o
laboratório de inovação da Johnson & Johnson no JLabs Houston, no Texas –
que atua como uma das incubadoras da multinacional norte-americana voltadas a
apoiar o desenvolvimento de projetos de startups em ciências da vida e para o
qual a Hoobox foi selecionada para incubação por prazo indeterminado.
Os pesquisadores do laboratório de inovação da empresa americana também têm
auxiliado a equipe da Hoobox a avançar nos quesitos de usabilidade, design e
segurança do sistema de controle da cadeira de rodas por expressões faciais e no
desenvolvimento de um projeto de uma babá eletrônica inteligente.
“A ideia é utilizar reconhecimento facial para detectar quando o bebê está
acordado ou dormindo, durante à noite, por exemplo, e qual a posição do corpo
dele no berço, se está deitado, sentado ou em pé”, disse Pinheiro.
Em parceria com outra startup americana, situada no Vale do Silício – cujo
nome não pode ser revelado por questão de confidencialidade –, a Hoobox
iniciará, em abril, um projeto em que pretende adaptar a tecnologia de detecção
de comportamentos humanos para monitorar passageiros de carros autônomos.
O objetivo do projeto será usar a tecnologia para monitorar o estados de
atenção e de cansaço de passageiros sentados no banco da frente de um carro
autônomo para identificar se estão aptos ou não para assumir o controle do
veículo em situações de emergência ou de risco.
“A startup da qual somos parceiros tem desenvolvido tecnologias para carros
autônomos e necessitava de um sistema de reconhecimento facial com alta precisão
para monitorar e detectar o comportamento de passageiros nesse tipo de veículo”,
disse Pinheiro.
De acordo com ele, a tecnologia de reconhecimento facial da Hoobox funciona
independentemente da condição de iluminação – se em um ambiente muito escuro ou
muito claro – e da posição da cabeça da pessoa rastreada.
Ao contrário de uma tecnologia de reconhecimento facial largamente utilizada,
chamada de frame the face – em que é preciso que a pessoa olhe
diretamente em direção a uma câmera para ser reconhecida –, o sistema da Hoobox
dispensa o enquadramento do rosto para fazer a identificação.
“Nosso sistema permite fazer o reconhecimento da pessoa mesmo se ela estiver
de lado, em ângulo de até 60 graus, ou caminhando”, afirmou Pinheiro.
Essas características da tecnologia despertaram o interesse de empresas na
China. Tanto que a Hoobox está abrindo uma filial na cidade de Suzhou para
atender, principalmente, o segmento de segurança.
“Já temos clientes em Suzhou e outras cidades da China. Iremos implantar a
tecnologia em projetos de segurança patrimonial e controle de acesso, e também
um projeto-piloto de monitoramento de leitos de UTI”, disse Pinheiro.