04/06/2021 ( Caderno:
Seção Saúde )

Testes feitos por pesquisadores da USP com adultos saudveis mostram
que ingerir a quantidade certa de protenas
– independentemente da origem do nutriente –
o fator-chave para a sade dos msculos
(imagem: Pixabay)
Quando se trata de ganhar massa e fora muscular, mais importante atentar para a quantidade de protena ingerida do que para a origem do nutriente. Esta a concluso de um estudo que comparou o efeito de treinos de fora (musculao) em voluntrios que mantiveram dietas onvoras e veganas, ambas com teores proteicos considerados adequados.
No estudo, conduzido por pesquisadores da Universidade de So Paulo (USP), um total de 38 jovens adultos saudveis – sendo 19 onvoros e 19 veganos – foram monitorados por 12 semanas. Alm dos treinos desenhados para o ganho de massa e fora muscular, os voluntrios seguiram dietas mistas (com fontes proteicas animais e vegetais) ou exclusivamente base de plantas, ambas com o teor indicado de protena (1,6 grama por quilo corporal por dia). Ao final dos trs meses, no foi verificada diferena no percentual de ganho de massa e fora muscular entre os indivduos veganos e onvoros.
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“Assim como qualquer outra protena do nosso corpo, entre elas as que compem as clulas da pele e do cabelo, que morrem e so renovadas, os msculos diariamente passam por perodos de sntese e de degradao. Alimentao [ingesto de protenas] e exerccio fsico so os principais reguladores do processo de balano proteico, favorecendo a sntese sobre a degradao”, explica Hamilton Roschel, autor do estudo e um dos coordenadores do Grupo de Pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrio (Applied Physiology and Nutrition Research Group) da Escola de Educao Fsica e da Faculdade de Medicina da USP.
A qualidade da fonte proteica est relacionada com o seu perfil de aminocidos essenciais, em particular de leucina, um aminocido-chave no processo de estimulao anablica para o msculo esqueltico. “As protenas de origem animal tm mais leucina do que as de origem vegetal. Como esse aminocido essencial no processo de sinalizao do estmulo anablico, especula-se que uma alimentao base de vegetais resultaria em menor contedo de leucina e, portanto, a um estmulo anablico tambm reduzido, o que afetaria o potencial de indivduos veganos de ganhar massa muscular”, diz Roschel.
O estudo, publicado na revista Sports Medicine, fruto do mestrado de Victoria Hevia-Larran, bolsista da FAPESP.
A pesquisa inova ao fazer uma anlise clnica do efeito da qualidade da fonte proteica nas adaptaes musculares ao comparar voluntrios veganos e onvoros. Isso porque a maioria dos estudos sobre o tema analisou o mecanismo da resposta anablica aguda do msculo em funo da fonte proteica em condio laboratorial e no o ganho de massa muscular em si. “O nosso achado mostra que, se ingerirem a quantidade adequada de protena, jovens adultos veganos no tm prejuzo no ganho de massa muscular. Na realidade, o resultado das duas dietas foi igual”, afirma Roschel.
No entanto, os pesquisadores destacam que, para fins de controle experimental, o aporte proteico foi equalizado entre as duas dietas por meio do uso de suplementos proteicos. No estudo, os voluntrios receberam suplementao de protena isolada do soro do leite (para onvoros) ou da soja (para veganos), de acordo com a necessidade individual e com base no clculo da alimentao de cada um, de forma a atingirem a meta de consumo proteico.
“Na prtica clnica, sabe-se que alimentos de origem animal so, em geral, mais densos em protena. Dessa forma, carne, leite ou ovos apresentam mais protena por grama de alimento que o arroz ou o feijo, por exemplo. Dessa forma, ao considerarmos uma aplicao clnica em que o aporte proteico seria provido apenas por alimentos de origem vegetal, indivduos veganos necessitariam ingerir um volume maior de alimentos para obter a mesma quantidade de protenas, o que pode, em alguns casos especficos, representar um desafio importante.”
Ao dar a quantidade adequada de protena para cada voluntrio, a origem da fonte proteica (dieta mista ou vegetal) no importou. “Esse nosso achado refora outros dados da literatura que apontam que uma dieta vegana absolutamente possvel de ser completa, se bem executada e planejada. Estudos anteriores sugerem que ela , inclusive, possivelmente mais saudvel do que uma dieta onvora. Entretanto, para isso, necessrio acompanhamento nutricional adequado e at mesmo um processo de educao nutricional acerca das escolhas que o indivduo dever fazer ao restringir sua alimentao a fontes vegetais”, afirma Roschel.
O pesquisador ressalta ainda que o estudo foi conduzido com jovens adultos saudveis e no possvel extrapolar os resultados para outras populaes, como a de idosos ou de pessoas com comprometimentos de sade. “Com a idade ocorre um fenmeno conhecido como resistncia anablica – uma resposta anablica subtima ao estmulo da nutrio e do exerccio em comparao a jovens. Ou seja, para que o idoso apresente uma resposta mxima, ele precisa de muito mais protena do que um indivduo jovem saudvel. Portanto, preciso ter cautela ao generalizar o nosso achado para toda a populao”, afirma.
O artigo High-Protein Plant-Based Diet Versus a Protein-Matched Omnivorous Diet to Support Resistance Training Adaptations: A Comparison Between Habitual Vegans and Omnivores (doi: 10.1007/s40279-021-01434-9), de Victoria Hevia-Larran, Bruno Gualano, Igor Longobardi, Saulo Gil, Alan L. Fernandes, Luiz A. R. Costa, Rosa M. R. Pereira, Guilherme G. Artioli, Stuart M. Phillips e Hamilton Roschel, pode ser lido em https://link.springer.com/article/10.1007/s40279-021-01434-9.