Como controlar uma doença responsável por mais de 100 mil novos casos por ano, só no Brasil?
Especialistas da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia têm diversas respostas para a pergunta acima. A principal é a informação. O diagnóstico precoce é muito importante especialmente para interromper a cadeia de transmissão, pois cada paciente de tuberculose pulmonar sem tratamento pode contaminar entre 10 e 15 pessoas ao ano. Por outro lado, se este mesmo paciente receber o diagnóstico correto e iniciar prontamente o tratamento, em cerca de duas semanas ele deixa de transmitir a tuberculose e terá índice superior a 95% de chances de cura após o tratamento padrão de seis meses.
De acordo com a Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, a tuberculose é a infecção curável que mais mata em todo o mundo, deixando 20 mil novas pessoas doentes por dia e 5 mil mortos. Somente no Brasil, a média anual é de aproximadamente 100 mil casos novos e 6 mil óbitos, o que nos mantém entre os 22 países que concentram 80% dos mais de 8 milhões de novos casos de tuberculose registrados no mundo ao ano. Esses números representam, ainda, 35% dos casos da doença notificados anualmente nas Américas.
A DOENÇA
Apesar do tratamento predominantemente ambulatorial, a tuberculose representa a 9a causa de hospitalização no País, ocupando o 7o lugar em gastos com internações e a 4a causa de mortalidade por doenças infecciosas.
A tuberculose é causada por um microorganismo, o bacilo de Koch (Micobacterium tuberculosis) e transmitida pelas gotas de secreção respiratória que são liberadas durante a fala, espirro ou tosse, e que permanecem no ar por muitas horas. Os pulmões são os órgãos mais atingidos, mas não os únicos. De acordo com o dr. Fernando Fiuza de Melo, diretor técnico do Instituto Clemente Ferreira, referência ambulatorial em tuberculose da Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, a tuberculose pode alcançar várias partes de outros órgãos, como gânglios, sistema Nervoso Central, aparelho digestivo, olhos, ossos, entre outros.
A base do controle à doença é a descoberta e o tratamento dos casos de tuberculose pulmonar que eliminam bacilos, portanto os transmissores. A descoberta é feita pelo exame de escarro. O primeiro passo na tentativa de controlar a doença é a vacinação. Disponível gratuitamente em todo o país, a vacina BCG é aplicada em todo recém-nascido com mais de 2kg, nos primeiros 30 dias de vida, preferencialmente ainda na maternidade. Esta recomendação vigora desde 1972, por força de Portaria Ministerial da Saúde, e oferece cobertura para praticamente todas as crianças neste período.
De acordo com o dr. Sidney Bombarda, diretor da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia e médico da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina da USP, mesmo com a ampla cobertura da vacina e com a disponibilização de tratamento gratuito à população, ainda é muito difícil conter o avanço da doença. “Os grandes complicadores são as condições de vida da população e o abandono do tratamento. Depois de algumas semanas, o paciente tem uma melhora e, achando que está curado, deixa de se tratar. Invariavelmente os sintomas voltarão e este paciente terá de recomeçar o tratamento”.
O tratamento padrão é altamente eficaz e consiste na associação de três medicamentos, que devem ser tomados diariamente durante seis meses. Geralmente até o final do segundo mês de tratamento, sintomas mais exuberantes da doença, como tosse, expectoração, febre e emagrecimento, tendem a desaparecer, culminando no abandono precoce ou em irregularidade nas tomadas dos medicamentos se o paciente não estiver muito bem informado.
Esta prática pode resultar em resistência dos bacilos aos medicamentos, recidiva da doença em formas mais graves e a exigência de tratamento muito mais complexo, longo e de alto custo.
Apesar do tratamento predominantemente ambulatorial, a tuberculose representa a 9a causa de hospitalização no País, ocupando o 7o lugar em gastos com internações e a 4a causa de mortalidade por doenças infecciosas.
PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLE DA TUBERCULOSE (PNCT)
O Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) tem como objetivo promover o controle da tuberculose no Brasil. Por meio deste, toda a população brasileira tem direito a diagnóstico e tratamento gratuitos no Sistema Único de Saúde. Além dele, na tentativa de reduzir o abandono do tratamento e suas desastrosas conseqüências, o Ministério da Saúde também vem expandindo a supervisão do DOTs (sigla em inglês para Estratégia do Tratamento Supervisionado da Tuberculose), uma proposta de intervenção recomendada internacionalmente composta dos seguintes elementos – vontade política, retaguarda laboratorial adequada com busca ativa de casos, sistema de informação ágil e de qualidade, e tomada supervisionada do medicamento. “Para garantir que o paciente siga corretamente o tratamento, ele recebe a medicação e tem todo o seu tratamento observado pelos serviços de saúde. Feito isso, além do vale transporte e um lanche, ao final do mês, se não houver nenhuma falha, ele também recebe uma cesta básica”, explica o dr. Bombarda.
Esta estratégia de controle da tuberculose é recomendada internacionalmente e já vem acontecendo em diversos países com excelentes resultados. No ano de 1997, iniciou-se a implantação do DOTS nos serviços de saúde em todo o Estado de São Paulo. Desde então, observou-se um aumento na taxa de cura e uma diminuição na taxa de abandono.
O Estado de São Paulo notifica anualmente cerca de 21 mil casos, representando em números absolutos o maior contingente de casos do Brasil. A distribuição de casos, no entanto, não é homogênea. Dos 645 municípios existentes no Estado, 10 concentram 53% dos casos novos. O maior número de casos ocorre no município de São Paulo e os maiores coeficientes de incidência (número de casos por 100.000 habitantes) encontram-se nos municípios da baixada santista.
AIDS
Com o surgimento da Aids observou-se, tanto em países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, um crescente número de casos de tuberculose em pessoas infectadas pelo HIV. Nestes casos aumentam as chances de complicações, que levam à necessidade de internação e também à mortalidade. Estes pacientes chegam a ter 50 vezes mais chances de desenvolver a tuberculose do que o restante da população. Isso acontece em decorrência da diminuição da imunidade, o que favorece o adoecimento por tuberculose. No entanto, estudos recentes mostram que o risco de adoecimento por tuberculose nesses pacientes reduziu-se após a introdução da terapia combinada para o tratamento da aids.
24 de Março - Dia Mundial da Tuberculose
O Dia Mundial da Tuberculose foi lançado em 1982 e faz uma homenagem aos 100 anos do anúncio do descobrimento do bacilo causador da tuberculose, ocorrido em 24 de março de 1882, por Dr. Robert Koch.
A data é uma ótima oportunidade para a sociedade e órgãos governamentais se mobilizarem na luta contra a doença. Em São Paulo, a Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia em conjunto com as Secretarias de Saúde do Estado e do Município estarão desenvolvendo atividades junto à comunidade médico-científica e à população em geral visando divulgar a situação da doença e ampliar as ações no controle da tuberculose.
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